sábado, 26 de setembro de 2009

A ÚNICA CERTEZA

O amor não é como nada,
é isento da comparação com tudo.
Me vejo em sua frente, desnudo,
e me esqueço da mente cansada,
de meu lábio mudo,
mas não da jornada...

Conheço o amor e ele me conhece,
e, de tanto buscarmos um ao outro,
essa distância se arrefece.
Em meu espelho torto
sua imagem aparece
e me traz conforto...

Queria ser melhor poeta do que sou,
quem sabe saber de onde vem
o que escrevo e o que restou
de mim perante um amor além
de tudo o que se cogitou...
fazer palavra desse eterno bem...

Essa simplicidade no sentir
devo ao que a Amada me ensinou:
observar o tempo a ir
e sentir no tempo o que restou...
saber que o tempo há de vir,
e, porém, tudo já se consumou...

Deixei-me ser o sentimento
que hoje conheço de fato
como da vida o condimento,
como a ausência do tormento.
Só uma verdade acato:
maior do que o sonho é o momento
maior do que a vida é o amor
que me acompanha aonde for
a me estancar o lamento...

POEMA INCRIVELMENTE INÚTIL

Um piano traduz a minha vontade
em um som que em si mesmo nada diz...
a palavra percutida na tecla, infeliz,
se vê isenta de genialidade...

Hoje só sou comumente comum
em frente a um piano que me traduz
toda essa agonia em acordes de blues...
de tantos poetas, sou só mais um.

De novo cá estou com a noite perdida,
ladainha vil, já tantas vezes lida
que me envergonho de novamente escrever,
apesar de a noite apaixonar meu ser.

Deste poema inútil retiro a certeza
de que tudo desse mundo é passageiro,
assim como o poema, ato derradeiro,
sem inspiração, mas dono da realeza.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

GUERRA DO AMOR (Davi Alexandre de Souza)

Por que toda vez que te vejo sou tomado pelo medo ?
Nem sequer posso ouvir teu nome,
já fico totalmente paralisado...
Sempre que te encontro, volto atrás e me arrependo.
Que força é essa que me torna tão forte e ao mesmo tempo tão covarde?

Não te quero mais, vou desistir de você.
Quero ficar longe desse sentimento que, apesar de me conquistar, me amargura.
Minha curiosidade tímida se faz presente, imponentemente,
pois não ligo mais se você me ama, me odeia, ou pior,
nem sequer me conhece.

Não sou tão fraco assim, já passei por guerras.
Cicatrizes e histórias eu pude contar.
Fui cegado, tive o coração roubado e permaneço em pé.

Você não me escapa,
eu vou me vingar.
Te roubarei um beijo e teu corpo vou conquistar.
Você é meu objetivo, é quem me faz lutar.
Busco ir atrás de você, mas no meio do caminho me faço parar...

Ainda tenho tempo e não dependo de mais ninguém,
Porém a hora da escolha se faz pequena:
Bater ou correr, essa é a hora, eu sou um mestre em fugas,
mas hoje, só por hoje, quero chegar ao final do meu próprio fim.

Esta é a última de um coração de falsas cicatrizes e mentiras mil a falar.
Mas que finalmente teve a coragem de matar ou morrer de amor,
com um grito de guerra simples e eficaz... AMO VOCÊ !!!

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

INFINITO

Um garoto na rua observa o infinito
pelo vão que é o beco da região central
do centro da cidade. É mais um marginal,
assim descrito pelo o que é dito
na página do jornal...
ele come as laranjas que foram seu ganha pão
tentando os malabares no sinal,
e vê o céu quase inestrelado da região central
como mais um ponto de fuga pra seu coração,
que bate mais por teimosia do que por vontade.
Seu consolo é a liberdade
que aparentemente tem em seus olhos infantis...
imagina mais do que crê, não demonstra, mas vê
cada um que passa indiferente ao seu pedir
e jura que quando crescer, vai pisar em cada infeliz
que não estendeu sequer o dedo pra estancar sua ferida....
Um garoto observa o infinito e se vê.
Vê que tudo é infinito, e ele um nada...
sua cabeça pensa tanto que, cansada
dorme sobre o céu sem estrelas,
sem esperança e sem destino
do centro da cidade...
Que amanhã acorde vivo esse garoto,
que ninguem lhe faça mal algum,
que ele um dia possa ser mais um
dos homens únicos, e ainda que roto,
com seu corpo torto estirado ao léu
se veja tão infinito quanto o céu...

sábado, 19 de setembro de 2009

REFLEXO DO SOL

Se a bossa bate nova a batucada de meu peito,
a velha dor da rima crua se faz.
Nesse caminho tantas vezes feito
chego em curto tempo às fronteiras do jamais...

Há um certo clima no ar de quem se entende
embora não se suporte mais,
um certo desepero contido
que dispensa o metro heróico,
a rima rica, o tempo, o espaço, o sonho, a canção...
Há uma reticência significativa nos semblantes da noite
e uma vontade de quem vive sem saber porque...
uma vontade de saber de tudo o que a vida traz
e de tudo o que a vida parece negar...
Existe um medo escondido no fundo do armário
que pulsa... não de solidão, nem de dor,
mas de que tudo de repente passe e me leve a passar
ao nada....

A noite dialoga com o centro de meu ser
e o tempo se esconde atrás de uma estrela
pra que eu não o veja a passar pelos meus olhos,
adorando-o, temendo-o, amando-o... mas não sentindo-o.
Esse poema prosaico sai de mim mais expulso do que feito
e hoje sou só a expulsão do berro,
puro descontrole, puro carne, osso e mente,
sou o caos e me entrego a ele por um dia...
como sabiamente diz o poeta
entrego-me a enganar o engano
e ao fingir-me insano
sou a lucidez da noite que vaga no peito dos homens...

Resta apenas esse devaneio
expulso do pulso de minhas veias
e uma vontade de que o sol raie enfim
pra uma nova jornada igual
em que noto o diferente em mim
pra poder enfim ver na lua o reflexo de um Sol...

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

BANDONEON

A chuva na janela sugere Piazzolla
e um bandoneon agudo corta o ar
de meu aposento, e ao me deitar
o meu lamento funde-se à vitrola.
Penso no tragicômico ato da passada em falso...
penso no drama que o cérebro trama
enquanto os meus passos de pés e lama
conduzem meu corpo duro e descalço.
O mundo dorme enquanto penso
o pensar que deveria ser meu ultimo ato.
De pensar eu vivo e de pensar me mato,
na face há um esgar de acorde tenso....
Quem dera por um segundo eu fosse
o bandoneon a cortar o ar, tão doce,
tão fatal a ponto de poder,
com uma peça, matar ou morrer

domingo, 6 de setembro de 2009

SER

Assim que todo o tempo passe
e nos livre desse impasse,
de todo o sofrimento previsível,
do medo e do trauma inesquecível,
do vício, do erro e do engano,
haveremos de entender o mundo...

Assim que Cronos enjoar de nosso gosto
e nos vomitar no seio do real
descobriremos que a miséria do insosso
é da vida não saber do sal...

Um dia me vi perante a morte
e o tempo se desvaneceu, se extinguindo
em mil pedaços de luz forte
que haveremos de acabar unindo,
para que todo o Universo
tenha o som de UMA letra,
o brilho de UMA luz,
e a escrita de UM verbo...
"Ser"