quinta-feira, 28 de julho de 2011

CAPUZ

Brotou como vontade pura a sinergia
que definiu a coesão de tudo o que se esparsa,
esotérica ascensão ausente da farsa
de que tudo é caos, turba, orgia...
No centro de uma gana autofágica
reside o movimento do Universo,
buscando um devorar-se para destilar o inverso
de tudo o que em si mesmo não for pura mágica.
Chiaro-oscuros chovem no infinito
enquanto só há luz e não nos damos conta.
A luminosidade é auto-referencial, pois remonta
à existência de tudo o que existe em mais que eterno rito.
Portanto, àquele que me lê, profiro nadas,
pois somente o nada existe sem a luz,
a palavra é somente um capuz
para as existências evidentes, mas veladas...

segunda-feira, 25 de julho de 2011

PAÇO DA LIBERDADE

A praça e o paço por onde passam
os pés levianos de meu fim de dia
são a Atlântida além do naufrágio, visão arredia
dos tempos que se embaraçam...
Art-nouveau no centro do concretismo,
deslocada aparição exata ante o cinza
do asfalto que o céu espelha, ranzinza,
escancarada lição do mais puro hermetismo...
Os rostos talhados em pedras na arquitetura
são todos o meu, mas não me vejo
enquanto observo, pequeno, o desejo
de ser o prédio que a vista emoldura...
Enquanto a tarde se reitera e se esvai,
sumo de mim e sou o tempo breve
em que de Atlântida subiu à superfície o espírito leve
que ao homem legou a consciência do que à consciência atrai...
No último segundo de contemplação,
percebo um lampejo de luz arisca
brotando da janela da última elevação
em que, do prédio, Netuno me olha, e pisca...

domingo, 24 de julho de 2011

A POESIA DESPIDA II

Uma fotografia congelada me sorri,
enquanto me desfaço em agoras anteriores.
Sou congeladamente o passado que socorri
e abriguei internamente em desbotadas cores.
Vive ainda o momento em que fui estátua
no retrato que captou minha eternidade.
Me repito intensamente e, em minha fogueira-fátua,
se consome o último ar em que se exalou a novidade...

O solo é pisado por mim, defunto,
para que haja equilíbrio no retorno,
e, após um último alento morno,
a terra pisoteie o que em mim foi desconjunto...
Nesse momento, aos que ficam,
certamente serei mais retrato do que vida,
e enquanto à velha luz os novos velhos edificam
sorrio e sorrirei a poesia, despida....

quinta-feira, 21 de julho de 2011

OLHO

O olho tudo viu em sua perspectiva alta,
do ponto em que sobre a pirâmide flutua...
Aglomerados os sentidos a que a mente se habitua,
enxergou por não se ver no ponto em que a si ressalta...
A esfinge que o guarda, guardou a pergunta
antes que a si mesma devorasse...
calada, retirou-se à porta, astuta
e pediu para que de tempo lhe chamasse...
Vi de fora o outrora Todo
estilhaçado no vermelho da esfera costumeira,
última manifestação da causa primeira,
e quando despertei vi a lótus sobre o lodo...
E o que o olho viu, reunido em seu centro,
acima da esfinge que guardou as horas,
foi a si em minha sina de ver lados e ver foras
sem saber que, acima da pirâmide, há o dentro.

terça-feira, 19 de julho de 2011

O MÁGICO

Suma na antítese, ao largo da inconsciência,

tropece nos ponteiros que o futuro da ampulheta sugere.

Circule todas as concepções quadradas, se esmere

ao fazer brotar sua subconsciência.

Exponha para uma platéia de ninguéns

o resultado de anos em combustão,

do desperdício de alma e dos vinténs,

da inconveniente mental indigestão.

Resplandeça na peça do quebra-cabeça

cuja imagem é mosaico cubista,

e em um poema prosaico e niilista,

reverta o tempo e desaconteça.

Mergulhe na terra, na areia do deserto,

respire o fogo que dali emana,

despindo-se então da roupagem tirana

que não foi você, mas chegou perto.

Reapareça no último segundo

para ser a mão do mágico na cartola,

retirando da tensão a esmola

de ausentar-se, por ora, do mundo...

quinta-feira, 7 de julho de 2011

ESCADA

Nuamente, a nuance de cor camaleônica da Lua
furtou a matiz de um céu essencial, em que repouso....
A partir desse momento, maior do que a palavra que ouso,
o silêncio enxurrou meus olhos com uma transparência unicamente sua...
Eu era a noite e o silêncio, e transbordei a mim.
Vazou inútil semiologia,
vestida cafajestemente de poesia,
vestida de linearidade, de começo, de fim....
A beleza, intangível enteal, iluminava como estrela
longínqua, quiçá inexistente, e minha única intenção, vê-la,
se apagou em minha pálpebra, mas não em minha retina.
É o momento em que a mente desatina....
Perdido em meus significados, encontrei nadas
que de todo se vestiam, como Luas veladas.
Quando me ausentei de toda versificação,
vi espelhos, e, em sua imagem, oração.

Descrevo assim minha queda, adâmico tropeço,
em que caí em mim e não me satisfiz...
Observo agora na lunar luz a escada que refiz
buscando apenas o cair em Si, meu grande recomeço....